domingo, 22 de agosto de 2010

1. 2. 3...

1.

Existe em mim.
Dentro de mim – no cérebro ou no peito,
atrás dos olhos, não sei onde, não sei... – um lugar,
um espaço,
um sector,
seja o que for (que eu não sei), envolto em neblinas,
desfocado, confuso, fugaz, embaçado,
descorado,
indefinido – sem forma, sem nome,
sem calor ou frio...
que não é meu e inda assim o é.
Que sendo meu não me pertence,
não o conheço,
que não sei de onde vem
mas que se instala, muito à sua vontade, no seu conforto,
deixando-me desconfortável e sem vontade.

Toma conta de mim mas de mim não cuida.

Vive em meus sonos
e acorda quando eu.
Toma o mesmo café que eu tomo.
Veste-se-me.
Enrola-se-me.

Acompanha-me sem que me faça companhia
e
embaça a minha vida todo o ano:
da Primavera ao inferno.


2.

Há uma urgência.
Uma sensação de não ter tempo;
de não ter mais tempo...
de ser já tarde.
Irremediavelmente tarde!
Há um sentimento de haver esquecido...
... Algo muito importante que me escapa, que não acho...
... mas a certeza de o dever ter feito.
Há um sufoco.


3.

Sinto-me tentar cruzar um caminho com dois sentidos
e
um tráfego intenso e desmedidamente veloz.

Sou empurrado pela direita.
Sou empurrado pela esquerda.

Acabo chegando...
... não sei a onde...,
como se depositado pela espuma do Mar que me arrasta,
depois de as Ondas se encontrarem cansadas de haver zombado de mim:
rebolando-me o corpo e
enrolando a minha consciência do eu,
do meu.
Do onde
e
do quando.
E, à beira-mar duma praia que desconheço,
não encontro alma-viva ou salvador que possa,
pelo menos,
ensinar-me como sair de lá.
De ali.
Dalí.

O cansaço feito sonho esmagado e amassado com a realidade...
Surreal. Sem idade, sem inocência.
Sem força.
Sem coragem.
Os meus olhos sem miragem.
Sem mantimentos p’ra viagem,
sem mapas na bagagem...
Sem um banco na paragem.

Sem tempo na contagem.

Tanto esforço sem vantagem.
(Tanto faz ter o leito ou ser a margem...)

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